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outubro 07, 2011

o toque num olhar

provei-te em um só 
trago
e como o vento
deixei-te passar por mim
desvendando
um pedaço escondido
da tua alma
revolvi-te
nos extensos delitos
de longos cabelos brancos
e sem demora
branqueei as nuvens negras
do teu semblante mascarado
prensei canto por canto
das tuas mãos e entreguei-lhes
a doce missão de
preencherem o meu sorriso
todos os dias à mesma hora
cruzando a respiração, bebendo do mesmo ar como
petição aos mais profundos sonhos
resposta ancorada sem fundo, medida
nem abutres no horizonte
apenas o breve toque 
num olhar de nós
despido

(NAF)
16/10/11
(Imagem- Pintura de José Augusto Coelho)

outubro 01, 2011

beiço moldado

posso escrever um poema
e dizê-lo a uma multidão
ou sentado posso esbatê-lo
e cantá-lo na minha mão
mas se o vento for contrário
e se onde for se fizer tarde
terei um rio que atravessar
nadar contra a corrente
subirei?
subirei se for tarde...
subirei se a maré me fizer recuar subirei?
e se as longas caminhadas
nos secos pastos da vida
me levarem à fonte
descerei?
descerei se for cedo ainda
voltar...
descerei dos costumes
ricos aprumos e confortos de veludo descerei? 
se os meus pés em voz se tornarem
e se as flores no caminho guardarem
repousarei?
repousarei se os meus olhos se fecharem...
repousarei pela sétima colina
do teu beiço
moldado ao meu corpo

(NAF)
01/10/11
Imagem: Quadro da obra de Sophie Fischer

idiomas íntimos


palmas são o vómito da plateia alucinada
nos dias em fardos de palha
cobertos pelo pesar de uma costas arqueadas
de dor
e é esse o riso e o orgulho dos que esperam
pela oportunidade de darem ao corpo alheio
um estou aqui, dei-te de mim
não me esqueças jamais
e na escuridão dos alvos fáceis são perpetuados
os cânticos diurnos por felicidade
de coisa nenhuma
enquanto os ramos do nosso lado
são atirados para um abismo
cuja corda não está presa nas nossas mãos
guarda pois esse teu sorriso de que falas
e atreve-te a mergulhar no centro da terra
cultivando as raízes dos idiomas íntimos
com as lágrimas
possíveis
dos teus olhos


(NAF)
30/09/11



pintassilgo sonhador

levanto-me no céu
e lá vou eu
pintassilgo sonhador


e grito aos quatro ventos
sem desalento
que arranhe o meu sabor


plano alto sem ver limite
mas tento
na dança das asas que me agita


sei que vou ouvir
um canto novo
e sonho
nas asas do coração

(NAF)
30/09/11

verdade sem som

existe na minha cabeça
uma esfera azul
perdida no vácuo do tempo


e um silêncio zeloso
pelo vazio dos
passos firmes na lua


por vezes o lago azul de prata
faz-se memória acesa


mas na minha cabeça
tento traçar um plano
em linha recta


voltando para trás apenas
para levar algumas estrelas cadentes
ao seu destino


e é nesta verdade sem som 
que me busco e me levanto 
perdendo-me no espaço mudo
dos meus pensamentos

(NAF)
28/09/11